O chamado da Noite
10 anos antes.
A Lua cheia amarelada era a única coisa que iluminava aquela Noite. A luz, no entanto, lutava para permanecer viva no meio de todas aquelas nuvens.
Era assim que se encontrava a mente de Yoru.
O som abafado das patas afundando na terra a passos rápidos era a única coisa que podia ser percebida. Sua pelagem praticamente toda preta, somente as patas e barriga brancas, o faziam ficar tão bem escondido no meio da mata alta, assim como sua velocidade fazia parecer que um rastro de fumaça súbito havia passado e nada mais que isso.
A jovem raposa que parecia sem rumo e desesperada, ganiu baixo de dor. Algumas vezes esbarrando em galhos e troncos pelo desnorteio, piorando mais seu estado.
Depois de um tempo, não sabia quanto, acabou chegando a uma clareira, com uma árvore enorme, de tronco forte com algumas amarrações com cordas bem grandes, que a pequena raposa sabia exatamente o porquê.
Shimenawa.
O lupino soltou algo como um suspiro, um “yiip” baixo e solto, seguindo lentamente até as raízes, encostando-se ali. Estaria seguro, ao menos por um tempo.
Olhou para si. Suas patas, antes brancas, estavam cheias de terra e sangue seco. Não era seu sangue, não teria com o quê se preocupar, mas a visão o trazia angústia. Subiu um pouco a linha de visão e percebeu aquela cicatriz enorme cruzando toda sua axila direita, tinha um aspecto tão velha, como se tivesse mais de dez anos.
Nem parecia que havia sido feita há menos de um dia.
Soltou um grunhido como se teimasse consigo mesmo e foi cambaleando até um lago que conseguia ouvir nas proximidades. Entrou na água sem submergir, lavando apenas sua barriga e patas calmamente.
Mas se sentia observado. Percebeu então que a floresta estava quieta até demais.
Olhou ao redor, a procura do que o via com tanta intensidade. Assustou-se por um breve momento, percebendo que corujas, roedores, cervos, todos os animais que continham naquele bosque o encaravam.
Você não deveria estar aqui, era o que aqueles olhos indicavam.
Aqui onde? Na floresta?
Não, aqui.
A raposa soltou um leve silvo e correu de volta para a clareira, parecia o único lugar que deveria estar.
Ao se deitar na base da árvore, apoiou a cabeça em suas patas agora limpas. Porém sua mente nublada não o deixava em paz.
Os olhos grandes e dourados encontraram o satélite natural. Lua e Noite, fitando-se em meio a cumplicidade do breu.
A Esperança se foi. A Noite pegou todo seu breu e agiu em sua memória e fez mais do que devia. Agora não tinha para onde ir, só fugir.
A floresta agora era sua nova casa. Um uivo agudo pôde ser ouvido ao longe.
E com esse pensamento, os olhos áureos foram tomados pela escuridão.
“Nozomi…. Desculpe-me.”